quarta-feira, 5 de dezembro de 2018

ESTUDOS INDEPENDENTES - SOCIOLOGIA - 2º ANO - PROF. JOSÉ EDILMO



NOME:                                                                                                       
2º ano do Ensino Médio
TURMA: 
Data    29 / 11 / 18

DISCIPLINA: SOCIOLOGIA   
PROF.: JOSÉ EDILMO 
ASSUNTO: ESTUDOS INDEPENDENTES 
VALOR: 40 PTS 
NOTA:



DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA

Cidadania é o exercício pleno dos direitos civis, políticos e sociais, é saber dizer obrigado, desculpe, por favor e bom dia quando necessário. Cidadania é o direito de ter uma ideia e poder expressá-la. É poder votar em quem quiser sem constrangimento. É processar um médico que cometa um erro. É devolver um produto estragado e receber o dinheiro de volta. É o direito de praticar uma religião sem ser perseguido. Há detalhes que parecem insignificantes, mas revelam estágios de cidadania: respeitar o sinal vermelho no trânsito, não jogar lixo fora da lixeira, não destruir o patrimônio público ou de uso público, etc. É lutar por seus direitos,mas também é cumprir seus deveres.

Por trás desse comportamento, está o respeito aos demais, pois a prática da cidadania envolve muito mais a coletividade do que o individual (embora também o seja). O direito de ter direitos é uma conquista da humanidade e não uma dádiva dos poderosos. Da mesma forma que a anestesia, as vacinas, o computador, a máquina de lavar, a pasta de dente, o transplante do coração. Foi uma conquista dura. Muita gente lutou e morreu para que tivéssemos direitos trabalhistas e o direito de votar. Lutou-se pela ideia de que todos os homens são iguais diante da lei (embora no Brasil isso ainda não seja uma realidade). Pessoas deram a vida combatendo a ideia errada de que o rei tinha direitos divinos e podia fazer tudo, cabendo ao povo obedecer cegamente.

DIREITOS DE CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS:

Em relação aos direitos do cidadão eles fazem parte dos direitos humanos, mas são basicamente os direitos civis (liberdade de pensamento, de religião, de ir e vir, direito a propriedade, direito a liberdade contratual, direito a justiça, etc.), os direitos políticos (direitos eleitorais, direitos de participar de partidos e sindicatos, direito de protestar, fazer passeatas, greves, etc.) e direitos sociais (moradia digna, educação, saúde, transporte coletivo, sistema previdenciário, lazer, acesso ao sistema judiciário, etc.), os quais nada mais são do que a amplificação dos direitos humanos que ao longo do tempo foram sendo incorporados, geralmente após muita luta, inclusive com derramamento de sangue. Mas, explicitamente em relação aos direitos humanos, há uma má interpretação, no sentido de relacioná-lo apenas aos direitos dos bandidos. É importante deixar claro que estamos falando da ideia central de democracia; nos países democráticos e desenvolvidos, a ideia e a prática dos direitos humanos já estão incorporadas à vida política e aos valores do povo. Mas, nos países que mais violam os direitos humanos, nas sociedades que marcadas pela discriminação e intolerância, a ideia de direitos humanos permanece ambígua e deturpada. É o caso do Brasil. As gerações mais jovens não viveram os anos da ditadura militar, mas certamente ouviram e leram a respeito da defesa dos direitos humanos em benefício daqueles que estavam sendo perseguidos por suas convicções ou militância política, daqueles que foram presos, torturados, assassinados, exilados, banidos. Mas talvez não saiba como cresceu, naquela época, o reconhecimento de que aquelas pessoas perseguidas tinham direitos invioláveis. Mesmo sendo julgadas e apenadas, estas pessoas continuavam portadoras de direitos humanos básicos: o direito a ter direitos (não ser torturado, ter um julgamento justo, direito a vida, etc.).

Infelizmente, após o fim do regime militar, a ideia de que todos, independentemente da posição social, tem seus direitos fundamentais garantidos, não prosperou. A defesa dos direitos humanos (DH) passou a ser associada à defesa dos criminosos comuns, os quais são, em sua maioria, oriundos da classe pobre. Essa questão deixou, por este motivo, de ter o mesmo interesse para a classe média.

O tema dos DH foi prejudicado pela manipulação da opinião pública, no sentido de associar direitos humanos com a bandidagem, com a criminalidade. Somos uma sociedade profundamente marcada pela desigualdade social e péssima distribuição de renda. As classes populares são geralmente vistas pelos mais ricos como "classes perigosas". São ameaçadoras pela feiura da miséria, pelo medo atávico das "massas". Assim, parece bem às classes dominantes criminalizar as classes populares associando-as ao banditismo, à violência e à criminalidade; porque esta é uma maneira de circunscrever a violência, que existe em toda a sociedade, apenas aos "desclassificados", que, portanto, mereceriam todo o rigor da polícia, da suspeita permanente, da indiferença diante de seus legítimos anseios.
É por isso que se dá nos meios de comunicação de massa (geralmente tendenciosa), ênfase especial à violência associada à pobreza, à ignorância e à miséria. É o medo dos de baixo - que, um dia, podem se revoltar - que motiva os de cima a manterem o estigma sobre a ideia de direitos humanos.
A questão dos direitos da cidadania diz respeito a ordem jurídica-política de um país, no qual uma Constituição define e garante quem é cidadão, que direitos e deveres ele terá em função de uma série de variáveis tais como a idade, o estado civil, a condição de sanidade física e mental, o fato de estar ou não em dívida com a justiça penal etc.
Atenção: Os direitos do cidadão e a própria ideia de cidadania não são universais no sentido de que eles estão fixos a uma específica e determinada ordem jurídico-política. Daí, identificamos cidadãos brasileiros, norte-americanos e argentinos, e sabemos que variam os direitos e deveres dos cidadãos de um país para outro. A ideia da cidadania é uma ideia eminentemente política que não está necessariamente ligada a valores universais, mas a decisões políticas. Um determinado governo, por exemplo, pode modificar as penalidades do código penal; pode modificar o código civil para equiparar direitos entre homens e mulheres; pode modificar o código de família no que diz respeito aos direitos e deveres dos cônjuges em relação aos filhos, etc. Tudo isso diz respeito à cidadania. No entanto, em muitos casos, os direitos do cidadão coincidem com os direitos humanos, que são mais amplos e abrangentes. Em sociedades democráticas é, geralmente, o que ocorre e, em nenhuma hipótese, direitos ou deveres do cidadão podem ser invocados para justificar violação de direitos humanos fundamentais.
Os Direitos Humanos são universais e naturais. Os direitos do cidadão não são direitos naturais, são direitos criados e devem necessariamente estar especificados num determinado ordenamento jurídico. Já os Direitos Humanos são universais no sentido de que aquilo que é considerado um direito humano no Brasil, também deverá sê-lo em qualquer país do mundo, porque eles se referem à pessoa humana na sua universalidade. Por isso são chamados de direitos naturais, porque dizem respeito à dignidade da natureza humana, porque existem antes de qualquer lei, e não precisam estar especificados numa lei, para serem exigidos, reconhecidos, protegidos e promovidos.

Evidentemente, é ótimo que eles estejam reconhecidos na legislação, é um avanço, mas se não estiverem, deverão ser reconhecidos assim mesmo. Poder-se-ia perguntar: mas por quê? Por que são universais e devem ser reconhecidos, se não existe nenhuma legislação superior que assim o obrigue? Essa é a grande questão da Idade Moderna. Porque é uma grande conquista da humanidade ter chegado a algumas conclusões a respeito da dignidade e da universalidade da pessoa humana. É uma conquista de países filiados à tradição ocidental, não se aceita mais a prática da escravidão nem o trabalho infantil nem a tortura.

É claro que existe o ideal e o real; a escravidão é um absurdo, mas ainda há trabalho escravo em lugares distantes no interior do Brasil. O trabalho infantil é outro absurdo, mas há crianças vivendo e sendo exploradas nas ruas das maiores capitais do Brasil.
Assim, percebemos que os direitos naturais e universais são diferentes dos direitos ligados às ideias de cidadão e cidadania. Exemplo: uma criança ainda não é uma plena cidadã, no sentido de que ela não tem certos direitos do adulto, responsável pelos seus atos, nem tem deveres em relação ao Estado, nem em relação aos outros; no entanto, ela tem integralmente o conjunto dos Direitos Humanos. Um doente mental não é um cidadão pleno, no sentido de que ele não é responsável pelos seus atos, portanto ele não pode ter direitos, como, por ex., o direito ao voto, o direito plena à propriedade e muito menos os deveres, mas ele continua integralmente credor dos Direitos Humanos. Outro exemplo seria o dos grupos indígenas.

Quais são esses DH? Direito à vida, à liberdade, a ser tratado com dignidade (sem tortura ou crueldade), direito a uma justiça verdadeira, ou seja, são os mais básicos direitos básicos que todo ser humano deve ter, sem distinção de etnia, nacionalidade, sexo, raça, classe social, nível de instrução, cor, religião, opção sexual, ou de qualquer tipo de julgamento moral. Mas a não-discriminação por julgamento moral é uma das mais difíceis de aceitar; é justamente o reconhecimento de que toda pessoa humana, mesmo o pior dos criminosos, continua tendo direito ao reconhecimento de sua dignidade como pessoa humana. É o lado mais difícil no entendimento dos Direitos Humanos.

É bom lembrar que esse julgamento moral pode ser de vários tipos, pode ser, por exemplo, aquele que exclua determinados militantes políticos como o "terrorista" (aliás, o que é chamado de terrorismo pode ser, por mais ignóbil que seja, a continuação da guerra por outros meios). O terrorista pode perder a cidadania, mas continua fazendo parte da comunidade dos seres humanos e, portanto, pode ser preso e execrado pela opinião pública, mas continuará portador de direitos fundamentais, ou seja, não deve ser torturado, deve ter um julgamento imparcial, ter direito a advogado etc. É bom lembrar, também, que muitos dentre grandes Estados que hoje orgulhosamente defendem a democracia e os Direitos Humanos começaram em seguida a revoluções e atos que hoje nós chamaríamos de atos terroristas. Além de serem naturais e intrínsecos à natureza humana e universais, os DH também são históricos, no sentido de que mudaram ao longo do tempo. O núcleo fundamental dos Direitos Humanos é, evidentemente, o direito à vida, porque de nada adiantaria os outros direitos se não valesse o direito à vida. Quando se admite, por exemplo, o direito de se escravizar outra pessoa, se está colocando em dúvida o direito à vida, pois a pessoa que tem o direito de propriedade sobre outra tem também o direito sobre a vida e a morte dessa outra pessoa, que é sua propriedade.

EXERCÍCIOS
1-  Comente a expressão: "...a prática da cidadania envolve muito mais a coletividade do que o individual (embora também o seja)..."
2-  O direito de ter direitos foi uma conquista da humanidade ou foi uma dádiva dos poderosos? comente.
3-  O texto estabelece diferença entre direitos humanos e direitos do cidadão? Comente.
4-  Em relação ao nosso direito de ir e vir, eles são plenamente respeitados? Comente.
5-  O que o texto quer dizer com a expressão "...explicitamente em relação aos direitos humanos, há uma má interpretação, no sentido de relacioná-lo apenas aos direitos dos bandidos..."?
6-  Por que o texto diz que os direitos humanos são direitos universais e naturais?

7-  Por que o texto afirma que os direitos do cidadão e a própria ideia de cidadania não são universais?
8-  Todas as pessoas devem ter direitos humanos inalienáveis, mesmo os piores criminosos? Comente.
9-  Comente a expressão "...A ideia da cidadania é uma ideia eminentemente política que não está necessariamente ligada a valores universais, mas a decisões políticas..."
10-  Você é a favor ou contra a pena de morte? Justifique sua resposta
11-  Você é a favor ou contra a prisão perpétua? Justifique sua resposta
12-  É possível existir grupos humanos em um país democrático que não são cidadãos plenos e assim permanecerão? Comente.
13-0 que o texto quer dizer com a expressão "...nos países que mais violam os direitos humanos, nas sociedades que marcadas pela discriminação e intolerância, a ideia de direitos humanos permanece ambígua e deturpada..."
14-A cidadania começa já na escola, ou seja, já podemos exercê-la ainda como estudantes? Comente e dê exemplos.

15-Cidadania envolve apenas direitos ou também deveres? Comente.


A CONTRIBUIÇÃO DO ÍNDIO NA FORMAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA

Na Idade Média, a palavra "índio" era empregada para designar as pessoas que viviam nas Índias, ou seja, no oriente. Ao chegar às Américas, Colombo pensou que havia chegado as índias e resolveu chamar os nativos de índios. O conceito de "índio" é, portanto, uma invenção europeia. Além disso, os índios nunca foram e jamais se enxergaram como um povo uno. Pelo contrário, diferentes grupos indígenas nutriam grande animosidade e constantemente guerreavam entre si (historicamente, os índios brasileiros foram classificados segundo os principais troncos linguísticos, que são: Tupi-guarani, Macro-jê, Aruak e Karib. Inicialmente, os grupos que tiveram maiores contatos (nem sempre amistosos) com os portugueses foram os do tronco tupi ou tupi-guarani (tupiniquins, tupinambás, tamoios, caetés, potiguaras e tabajaras quase sempre aparecem citadas como as principais). Já os grupos que não eram do citado tronco tupi-guarani, foram chamados de Tapuías(geralmente povoavam o interior do Brasil). Mas os tupis não eram uma nação indígena homogênea, pois tinham grandes rivalidades internas que acabaram sendo exploradas pelos europeus que tentavam colonizar a região. Ainda hoje os historiadores não chegaram a um consenso sobre a melhor maneira de separar as principais tribos tupis e também para delimitar a área exata que cada uma delas ocupava no litoral. A medida que adentravam o vasto território, os portugueses perceberam que haviam centenas de povos com línguas, costumes e hábitos diferentes. Estima-se que na época eram faladas cerca de 1.300 línguas indígenas diferentes. Estima-se ainda que havia cerca de 3 milhões de indígenas nos primeiros anos da colonização, os quais viviam ainda num processo de transição do paleolítico para o neolítico, dependendo da caça, pesca, coleta, e iniciando uma agricultura, ainda muito rudimentar. Os portugueses, inicialmente, estabeleceram um sistema de trocas e favores com os índios, para tentar conquistar sua confiança, mas logo passaram a tentar dominar as terras e escravizar os nativos, os quais oferecerem bastante resistência por meio de fugas e de guerras contra o colonizador. Devido a resistência do índio, já em 1536, os portugueses deram início ao tráfico de escravos africanos. Nem todos os índios eram hostis ao colonizador. Em Casa Grande & Senzala, Gilberto Freyre comenta a respeito de etnias amigáveis, que contribuíram deliberadamente, principalmente através das índias que entregavam seus corpos aos prazeres do lusitano sedento de prazer, principalmente pela quase total ausência de mulheres brancas no Brasil (era uma reclamação constante dos governadores e donatários, pedindo mulheres brancas, pois a promiscuidade era enorme).

"Híbrida desde o início, a sociedade brasileira é de todas da América a que se constituiu mais harmoniosamente quanto às relações de raça: dentro de um ambiente de quase reciprocidade cultural que resultou no máximo de aproveitamento dos valores e experiências dos povos atrasados pelo adiantado; no máximo de contemporização da cultura adventícia com a nativa, da do conquistador com a do conquistado. Organizou-se uma sociedade cristã na superestrutura, com a mulher indígena, recém-batizada, por esposa e mãe de família; e servindo-se em sua economia e vida doméstica de muitas das tradições, experiências e utensílios da gente autóctone. Mesmo que não existisse entre a maior parte dos portugueses o pendor para a ligação, livre ou sob a bênção da Igreja com as caboclas, a ela teriam sido levados pela força das circunstâncias, gostassem ou não de mulher exótica. Simplesmente porque não havia na terra quase nenhuma branca; e sem a gentia era impossível povoar tão larga costa. O historiador Zacarias Wagner observaria no século XVII que entre as filhas das caboclas iam buscar esposas legítimas muitos portugueses, mesmo dos mais ricos, e até "alguns neerlandeses abrasados de paixões". Já não seria então, como no primeiro século, essa união de europeus com índias, ou filhas de índias, por escassez de mulher branca, mas por decidida preferência sexual. Já o historiador Varnhagen chega a insinuar que, por sua vez, a mulher indígena, "mais sensual que o homem como em todos os povos primitivos [... em seus amores dava preferência ao europeu, talvez por considerações priápicas". Capistrano de Abreu sugere, porém, que a preferência da mulher gentia pelo europeu teria sido por motivo mais social que sexual: "da parte das índias a mestiçagem se explica pela ambição de terem filhos pertencentes à raça superior, pois segundo as ideias entre eles correntes só valia o parentesco pelo lado paterno". Para colonizar o enorme território, teve Portugal de valer-se no século XVI do resto de homens que lhe deixara a aventura da índia. E não seria com esse sobejo de gente, quase toda miúda, em grande parte plebeia e, além do mais, moçárabe, isto é, com a consciência de raça ainda mais fraca que nos portugueses fidalgos ou nos do Norte, que se estabeleceria na América um domínio portu­guês branco ou rigorosamente europeu. A transigência com o elemento nativo se impunha à política colonial portuguesa: as circunstâncias facilitaram-na. A luxúria dos indivíduos, soltos sem família, no meio da indiada nua, vinha servir a poderosas razões de Estado no sentido de rápido povoamento mestiço da nova terra. O certo é que sobre a mulher gentia fundou-se e desenvolveu-se através dos séculos XVI e XVII o grosso da sociedade colonial, num largo e profundo mestiçamento, que a interferência dos padres da Companhia salvou de resolver-se todo em libertinagem para em grande parte regularizar-se em casamento cristão.

O ambiente em que começou a vida brasileira foi de quase intoxicação sexual. O europeu saltava em terra escorregando em índia nua; os próprios padres da Companhia precisavam descer com cui­dado, senão atolavam o pé em carne. Muitos clérigos, dos outros, deixaram-se contaminar pela devassidão. As mulheres eram as primeiras a se entregarem aos brancos, as mais ardentes indo esfregar-se nas pernas desses que supunham deuses. Davam-se ao europeu por um pente ou um caco de espelho. A mulher gentia temos que considerá-la não só a base física da família brasileira, aquela em que se apoiou, robustecendo-se e multiplicando-se, a energia de reduzido número de povoadores europeus, mas valioso elemento de cultura, pelo menos material, na formação brasileira. Por seu intermédio enriqueceu-se a vida no Brasil, como adiante veremos, de uma série de alimentos ainda hoje em uso, de drogas e remédios caseiros, de tradições ligadas ao desenvolvimento da criança, de um conjunto de utensílios de cozinha, de processos de higiene tropi­cal - inclusive o banho frequente ou pelo menos diário, que tanto deve ter escandalizado o europeu porcalhão do século XVI. Ela nos deu ainda a rede em que se embalaria o sono ou a volúpia do brasileiro; o óleo de coco para o cabelo das mulheres; um grupo de animais domésticos amansados pelas suas mãos.

Da cunhã é que nos veio o melhor da cultura indígena. O asseio pessoal. A higiene do corpo. O milho. O caju. O mingau, O brasileiro de hoje, amante do banho e sempre de pente e espelhinho no bolso, o cabelo brilhante de loção ou de óleo de coco, reflete a influência de tão remotas avós. O índio contribuiu na obra de conquista dos sertões, de que ele foi o guia, o canoeiro, o guerreiro, o caçador e pescador. Muito auxiliou o índio ao bandeirante mameluco, os dois excedendo ao português em mobilidade, atrevimento e ardor guerreiro; Na obra de sertanismo e de defesa da colônia contra espanhóis, contra tribos inimigas dos portugueses, contra corsários. índios e mamelucos formaram a muralha movediça, viva, que foi alargando em sentido ocidental as fronteiras coloniais do Brasil ao mesmo tempo que defenderam, na região açucareira, os estabelecimentos agrários dos ataques de piratas estrangeiros. Cada engenho de açúcar nos séculos XVI e XVII precisava de manter em pé de guerra suas centenas ou pelo menos dezenas de homens prontos a defender contra selvagens ou corsários a casa de vivenda e a riqueza acumulada nos armazéns: esses homens foram na sua quase totalidade índios ou caboclos de arco e flecha. A enxada é que não se firmou nunca na mão do índio nem na do mameluco; nem o seu pé de nômade se fixou nunca em pé-de-boi paciente e sólido. Do indígena quase que só aproveitou a colonização agrária no Brasil o processo da coivara, que infelizmente viria a empolgar por completo a agricultura colonial. O conhecimento de sementes e raízes, outras rudimentares experiências agrícolas, transmitiu-as ao português menos o homem guerreiro que a mulher trabalhadora do campo ao mesmo tempo que doméstica. Se formos apurar a colaboração do índio no trabalho pro­priamente agrário, temos que concluir... pela quase insignificância desse esforço. O que não é de estranhar, se considerarmos que a cultura americana ao tempo da descoberta era a nômade, a da floresta, e não ainda a agrícola; que o pouco da lavoura - mandioca, cará, milho, jerimum, amendoim, mamão - praticado por algumas tribos menos atrasadas, era trabalho desdenhado pelos homens - caçadores, pescadores e guerreiros - e entregue às mulheres, diminuídas assim na sua domesticidade pelo serviço de campo tanto quanto os homens nos hábitos de trabalho regular e contínuo pelo de vida nômade. Daí não terem as mulheres índias dado tão boas escravas do­mésticas quanto as africanas, que mais tarde as substituíram como cozinheiras e amas de menino do mesmo modo que os negros aos índios corno trabalhadores de campo."
(Freyre, Gilberto. Casa Grande & Senzala, trechos do capitulo II).

Da culinária, herdamos dos índios as culturas do caju, goiaba, guaraná, palmito, mandioca, macaxeira, milho, inhame, cará, jerimum, pimenta, etc., os quais substituíram a falta do trigo. Da mandioca se extraía um veneno que, se ingerido, provocava a morte. O indígena sabia processar a mandioca para extrair dela a massa e a goma para fazer tapiocas, beijus, farinha, bolos, etc. Também o milho, um cereal totalmente americano, era muito utilizado para diversas utilidades. Para cada doença, o indígena tinha um chá ou uma bebida especial. Unindo superstição ao conhecimento empírico, os nativos desenvolveram uma medicina natural que hoje em dia tem servido de base para muitas pesquisas médicas, algumas já comprovadas. Ainda hoje, nos mercados populares do país, encontram-se ervas para todos os males, das dores de barriga até a inapetência sexual. De todos os hábitos, porém, o do banho diário foi o que mais escandalizou o português. Considerado até prejudicial à saúde, o português com dificuldade se adaptou ao regime higiênico da colônia, cujo calor era causa principal dos quase 15 banhos diários tomados pelos índios que os cronistas coloniais registraram.Em relação ao idioma, os índios enriqueceram a língua portuguesa, através de diversas palavras incorporadas ao vocabulário tais como Açucena, abacaxi, caboclo, gambá, catapora, Morumbi, macaxeira, jabiraca, Jacarepaguá, Jaguar, Jiboia, Copacabana, Ipanema, carioca, Ceará, Paraíba, Pará, Capibaribe, Beberibe, Jaguaribe, Camaragibe, Araraquara, Piracicaba, Paraná, Pernambuco, toró, sagui, saci, etc.

Em relação à religiosidade imposta pelo branco, o catolicismo não sairia ileso do contato cultural com o nativo. Não deixou de existir uma fusão das crenças indígenas com o catolicismo, o qual tornou-se mais folclórico, menos ritualístico, cheio de superstições. A própria umbanda, adaptação da religião dos negros à realidade da colônia, possui algumas influências indígenas, como o caboclo e ervas para tirar maus espíritos. De raiz totêmica e fetichista, a religião primitivista dos índios, que levava em conta o culto aos elementos da natureza, teve dificuldade em se submeter ao catolicismo. A única aproximação possível foi a veneração aos santos, levando mesmo assim, em conta os rituais próprios dos índios, que reverenciavam suas entidades com festas, sacrifícios, deles recebendo curas e ações sobrenaturais por meio dos pajés ou feiticeiros das tribos. Muitas dessas práticas ainda resistem ao tempo, no Sertão, por meio das rezadeiras, que não deixam de constituir um ritual mágico de pedir a saúde.

QUESTIONÁRIO:
1- Por que a palavra índio é uma construção européia?
2 — Comente o texto: "Híbrida desde o início, a sociedade brasileira é de todas da América a que se constituiu mais harmoniosamente quanto às relações de raça: dentro de um ambiente de quase reciprocidade cultural que resultou no máximo de aproveitamento dos valores e experiências dos povos atrasados pelo adiantado; no máximo de contemporização da cultura adventícia com a nativa, da do conquistador com a do conquistado.
3 — Havia diferenças entre os grupos indígenas? Comente.
4 - O índio contribuiu para a expansão e defesa territorial do Brasil? comente.
5 — Em relação a mestiçagem, a mesma servia aos interesses da Coroa portuguesa? Comente.
6 — Comente a respeito da luxúria abordada no texto de Casa Grande & Senzala. 7— Em relação aos costumes e a culinária, comente a contribuição indígena.
8 — O vocabulário português foi influenciado pela cultura indígena? Comente.
9 — A religiosidade brasileira sofreu influência indígena? Comente.
10 — Analisando o texto, pode-se afirmar que o índio era preguiçoso, ou isso é uma visão preconceituosa? Comente.
11— A contribuição indígena na formação da sociedade brasileira foi importante?


A CONTRIBUIÇÃO DO NEGRO NA FORMAÇÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA - 

TEXTO E QUESTIONÁRIO
O processo da colonização brasileira traz consigo traços culturais diferentes trazidos pelos europeus, índios e africanos, os quais contribuíram nos aspectos econômicos, sociais e políticos para a formação da identidade nacional. O negro começou a ser introduzido no Brasil no final do século XVI, com o objetivo de substituir a mão-de-obra indígena, passando a fazer parte como o principal construtor da grandeza econômica da colônia e um dos principais formadores da nossa sociedade. Falar sobre a contribuição do negro para a formação da sociedade brasileira é falar daqueles que plantaram cana-de-açúcar, garimparam o ouro, construíram casas, casarões, igrejas, fortes, sobrados, cidades inteiras, num mundo feito para brancos, os quais os viam apenas como animais ou objetos, ferramentas sem nome, sem memória, sem história e sem mérito algum pelo que realizaram na construção do país e da sociedade, que cada vez, mas os influenciava pela cultura, religião e até mesmo pela intensa mestiçagem, tanto com o branco como com o índio. O negro em geral não era tido como gente, e por isso não existia em termos de ter identidade, cultura e história. O negro, que outrora na África era príncipe ou rei de uma grande tribo, agora tinha seu nome, sua crença, sua dignidade e sua história apagada pelo europeu que o levou ao cativeiro.


O NEGRO NA ÁFRICA: O negro não veio de um continente desorganizado, sem cultura, sem tradição e sem passado. Essa visão distorcida da África era do europeu, ignorante de uma realidade diferente da sua. Para o europeu, o negro era um ser inferior e que só servia como escravo. A África tinha impérios e reinos, além de diversas confederações tribais e cidades-pousadas com seus ricos mercados no caminho do ouro, das especiarias e do marfim. Seus mercados eram ricos em variedades de coisas como o sal e até escravos (como os europeus também). Em toda a África havia povos guerreiros, pescadores, caçadores, pastores, comerciantes e agricultores, ou seja, não era um continente desorganizado como afirmava o europeu. A religiosidade africana é diversificada (animismo, islamismo, cristianismo, etc.), assim como os idiomas e etnias. Havia rivalidades entre diversos povos e etnias africanos, assim como havia também entre os europeus. Quem capturava os negros na África eram em sua maioria os próprios negros, inimigos de reinos e tribos rivais, em troca de mercadorias dos traficantes (armas, pólvora, fumo, cachaça, cavalos, etc.). Isso nem nada difere dos brancos, os quais também escravizaram e comercializaram brancos, na antiga Grécia e Roma).

A VINDA PARA O BRASIL: Geralmente, os negros condenados a serem escravos eram os capturados através de guerras (de etnias inimigas) ou caçadas, os quais eram trocados por aguardente e tabaco. Os maltratos se iniciavam já no navio negreiro ou tumbeiro, onde os escravos vinham aglutinados e presos uns aos outros nos porões. Ali mesmo faziam suas necessidades e quase não se alimentavam. Tais condições precárias de higiene e alimentação geravam doenças e mortes. Em torno de trinta e cinco dias durava a viagem de Angola a Pernambuco, quarenta até a Bahia, e cinquenta até o Rio de Janeiro. A mortalidade era alta a bordo (em torno de 20% dos escravos morriam durante essa longa viagem). A viagem nesses navios era certeza de morte para boa parte dos escravizados, mantidos amontoados como animais ou objetos, acorrentados. Os que adoeciam eram muitas vezes jogados no mar para que não dessem trabalho ou contaminassem os demais.

O NEGRO COMO MERCADORIA: O tráfico negreiro tornou-se um grande negócio, algo extremamente lucrativo, o que fazia com que os comerciantes portugueses não parassem seus navios para os devidos reparos, e tornou-se comum navios com problemas de calafetagem, imundície, mastros desgastados e outros problemas, alguns dos quais poderiam resultar em naufrágio. Tudo em nome do lucro a qualquer custo. Os navios eram bem equipados para o transporte, mas os traficantes, em busca de mais lucros, chegavam a aumentar a quantidade de escravos em prejuízo da quantidade de alimentos e até de água a bordo, pondo em risco a segurança de todos. Os negros viajavam empilhados sem espaço até mesmo para suas necessidades naturais. Os navios brasileiros eram menores do que os holandeses, mas carregavam mais negros: enquanto um holandês transportava 300 negros em uma caravela, um brasileiro podia chegar a transportar 500. Nessas condições, a taxa de mortalidade era elevada chegando a 57% o número de mortos em uma viagem. Quando os escravos chegavam ao Brasil, passavam pelo período de engorda para melhorar a aparência e obter melhor preço no mercado, já que chegavam magros e debilitados. Existiam duas formas de venda dos escravos: uma era a venda privada e a outra eram leilões públicos. Os leilões que geralmente aconteciam nos portos, eram feitos com escravos recém-chegados, quinze dias após o desembarque. Começava-se com os mais difíceis de vender (doentes, com problemas de dentição, ferimentos, etc.), finalizando com os mais saudáveis.

O NEGRO, MÃO-DE OBRA ESSENCIAL: Para o Brasil a importação de africanos fez-se atendendo-se a diversas necessidades e interesses, incluindo a falta de mulheres brancas, o serviço doméstico e até as necessidades de técnicos em trabalhos de metal, durante o ciclo da mineração. O Nordeste e o Sudeste da colônia fundaram sua riqueza sobre a produção maciça de alguns artigos primários de exportação, dentre as quais a cana-de-açúcar, que foi por muito tempo o produto rei, sobretudo nas áreas litorâneas. O negro foi o responsável pelo desenvolvimento do Brasil colonial. A terra de um engenho não valia grande coisa sem a presença da mão de obra negra necessária para todo o processo produtivo do açúcar. Durante o ciclo da mineração, o escravo também era a peça fundamental para a produção do ouro. No sul do país, a produção das charqueadas também foi baseada na mão de obra escrava. Escravos dos campos, das minas e dos sertões viverão de maneiras diferentes suas relações com a sociedade que os obriga ao trabalho forçado.

CONSTRUINDO A SOCIEDADE: "... Todo brasileiro, mesmo o alvo de cabelo louro, traz na alma e no corpo - a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro. No litoral, do Maranhão ao Rio Grande do Sul, em Minas Gerais, principalmente do negro. A influência direta, ou vaga e remota, do africano. Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo, na música, no andar, na fala, no canto de ninar, em tudo que é expressão sincera de vida. Trazemos quase todos a marca da influência negra. Da escrava que embalou, que deu de mamar, de come. Da negra velha que nos contou as primeiras histórias de bicho e de mal-assombrado. Da mulata que nos tirou o primeiro bicho-de-pé de uma coceira tão boa. Da que nos iniciou no amor físico e nos transmitiu, ao ranger da cama-de-vento, a primeira sensação completa de homem. Do moleque que foi o nosso primeiro companheiro de brinquedo. Já houve quem insinuasse a possibilidade de se desenvolver das relações íntimas da criança branca com a ama-de-leite negra muito do pendor sexual que se nota pelas mulheres negras no filhos de pais escravocratas. A importância psíquica do ato de mamar, dos seus efeitos sobre a criança, é na verdade considerada enorme pelos psicólogos modernos; e talvez tenha alguma razão para supor esses efeitos de grande significação no caso de brancos criados por amas negras. É verdade que as condições sociais do desenvolvimento do menino nos antigos engenhos de açúcar do Brasil, como nas plantações da Virgínia e das Carolinas - do menino sempre rodeado de negra ou mulata fácil - talvez expliquem por si sós, aquela predileção. Conhecem-se casos no Brasil não só de predileção, mas de exclusivismo: homens brancos que só gozam com negra. De rapaz de importante família rural de Pernambuco conta a tradição que foi impossível aos pais promoverem-lhe o casamento com primas ou outras moças brancas de famílias igualmente ilustres. Só queria saber de molecas. Outro caso, de um jovem de conhecida família escravocrata do Sul: este para excitar-se diante da noiva branca precisou, nas primeiras noites de casado, de levar para a alcova a camisa úmida de suor impregnada de bodum da escrava negra sua amante. Casos de exclusivismo ou fixação. Mórbidos, portanto; mas através dos quais se sente a sombra do escravo negro sobre a vida sexual e de família do brasileiro..."

"...Longe de terem sido considerados apenas como animais de tração e operários de enxada, os negros desempenharam uma função civilizadora. Foram a mão direita da formação agrária brasileira; os índios, e sob certo ponto de vista, os portugueses foram a mão esquerda. E não somente na formação agrária. A mineração no Brasil foi aprendida dos africanos, ou seja, os negros ensinaram aos brancos as técnicas de garimpagem, trazidas da África. Max Schmidt destaca dois aspectos da colonização africana que deixam entrever superioridade técnica do negro sobre o indígena e até sobre o branco: o trabalho de metais e a criação de gado. Poderia acrescentar-se um terceiro: a culinária, que no Brasil enriqueceu-se e refinou-se com a contribuição africana..." (Freyre, Gilberto. Casa Grande e Senzala).

ORIGENS E RESISTÊNCIA: Como povo escravizado, o negro jamais deixou de lutar tanto para libertar-se da escravidão como para manter sua identidade cultural, que significou uma luta diária pela manutenção de seus valores culturais reelaborando-os para não perder tudo. Os povos africanos trazidos para o Brasil são originários de diversas regiões da África:

-África Ocidental - Yorubás (Nagô, Ketu, Egbá), Jejes (Ewê, Fon), Fanti-Ashanti (conhecidos como Mina), povos islamizados (Peuhls, Mandingas e Haussás);
-África Central - Bantos: Bakongo, Mbundo, Ovimbundo, Bawoyo, Wili (conhecidos como Angolas, Congos, Banguelas, Cabindas e Loangos);
-Sudeste da África Oriental - Tongas e Changanas entre outros (conhecidos como Moçambiques).

Estes povos trouxeram consigo seus costumes, crenças, línguas (hoje de uso litúrgico como o yorubá, o bakongo e o kimbundo), léxicos incorporados no nosso falar (línguas bantos), danças, ritmos, instrumentos musicais, culinária bem como seus deuses e seus ritos de culto. Mesmo dispersos no território brasileiro e, por vezes misturados para não se rebelarem (fazendo jus ao ditado "dividir para reinar"), retiveram uma parte de sua cultura para conservar sua identidade de grupo dominado. Por vezes, esta identidade constituiu um fator importante para resistir à escravidão. E o exemplo dos quilombos que existiram no Brasil-colônia dos quais o mais célebre foi o Palmares comandado por Zumbi. O Quilombo era uma instituição política dos guerreiros jagas ou yagas da Angola, termo que designava tanto a casa sagrada onde se realizavam as cerimônias de iniciação, como o campo de guerra e mais tarde o acampamento de escravos fugidos.

Nem a submetidos, nem os castigos físicos, eram suficientes para garantir a obediência dos escravos. Com alguma frequência, os castigos considerados excessivos podiam resultar em atos de vingança por parte dos escravos, resultando na morte do feitor, do senhor ou de seus familiares. Os escravos reagiam de diferentes maneiras diante da opressão do sistema escravista. Da mesma forma que promoviam fugas e revoltas, aproveitavam a existência de pequenos espaços para a negociação. Espaços que eles próprios conquistaram ao mostrarem aos senhores a necessidade de terem certa autonomia para o bom funcionamento do sistema escravista. Um destes espaços foi a criação de irmandades católicas de negros. As irmandades eram espaços permitidos dentro da legalidade nos quais o escravo podia manifestar-se, fora de suas relações de trabalho. Eram, assim, os únicos canais possíveis de organização dos escravos dentro do sistema colonial. Desempenhavam também a função de auxílio, em caso de doença e/ou morte, e proteção aos seus membros. Em certo sentido, era através da religião católica que o escravo encontrava algum lenitivo para sua situação. Tudo indica que a permissão para a criação das irmandades de negros tenha sido dada com o intuito de obter melhores resultados na cristianização dos escravos, já que, para muitos senhores, as manifestações de alegria de fundo religioso serviam para tentar evitar as rebeliões, fugas e violência. Ainda hoje subsiste uma visão bastante equivocada de como era exercido o domínio senhorial. Frequentemente, quando se fala em escravos tem-se em mente a imagem de uma pessoa de cor negra acorrentada a um tronco. Entretanto, as pesquisas têm mostrado que não eram raras as ocorrências de escravos que saíam à noite e aos domingos, voltando ao trabalho no dia seguinte. Era comum que negros desempenhassem funções que necessitavam de uma maior liberdade de ir e vir, como os escravizados que trabalhavam no transporte e venda de alimentos ou que trabalhavam embarcados. Isso sem falar em uma modalidade de exploração do trabalho escravo que consistia no aluguel do escravizado para terceiros, para os quais desempenhavam diversas atividades. Estes escravos eram chamados de "negros de ganho" e eram bastante comuns em ambientes urbanos. Os "negros de ganho" trabalhavam para seus senhores como vendedores, comercializando hortaliças, comidas prontas, peixes, fazendas e outros gêneros. Isso permitiu que muitos escravos conseguissem juntar certa renda para comprar sua carta de alforria.

A CULTURA: A contribuição negra vai além da povoação e da prosperidade econômica através do seu trabalho. Vindos de diversas partes da África, os negros trouxeram suas matrizes culturais e transformaram não apenas sua religião, mas todas as suas raízes em uma cultura de resistência social. A influência na língua portuguesa veio principalmente do iorubá, notada principalmente no vocabulário. (palavras como caçula, cafuné, moleque, maxixe e samba, entre centenas de outros vocábulos). O negro, deu seu ritmo à música brasileira. Por isso se diz que a música popular brasileira nasceu na África. A raiz negra está em tudo: no samba, no pagode, no afoxé, no carimbó, maxixe, coco, maracatu, baião, forró, embolada, etc. Além dos ritmos, os africanos trouxeram também instrumentos, como o berimbau, agogô, maracá, alfaia, atabaques, etc. Nos esportes, o negro criou a capoeira, considerada desde 2008 como Patrimônio Cultural do Brasil e um dos poucos esportes genuinamente brasileiros.

A RELIGIOSIDADE: As diversas etnias africanas possuíam crenças diversas que se modificaram no espaço colonial. De forma geral, o contato entre nações africanas diferentes empreendeu a troca e a difusão de um grande número de divindades. A Igreja Católica se colocava em um delicado dilema ao representar a religião oficial do espaço colonial. Em algumas situações, os clérigos e os próprios donos de escravos tentavam reprimir as manifestações religiosas. Em outras situações, preferiam fazer vista grossa aos cantos, batuques, danças e rezas ocorridas nas senzalas. Do ponto de vista da elite colonial, a liberação das crenças religiosas africanas era positiva, pois alimentava antigas rivalidades contra outras etnias também aprisionadas, o que, em tese, dificultaria a ideia e a organização de fugas, revoltas e a formação de quilombos e levantes nas fazendas. Aparentemente, a participação dos negros nos rituais católicos poderia representar o ato de conversão; Contudo, muitos escravos, mesmo se reconhecendo católicos, não abandonaram a fé em sua religiosidade africana. Ao longo do tempo, a coexistência das crendices abriu campo para que novas experiências religiosas — dotadas de elementos africanos, cristãos e indígenas — fossem estruturadas no Brasil. Aos poucos nascem e se desenvolvem estruturas religiosas novas, mesclada de elementos africanos e europeus. Alguns senhores permitiram que os negros dançassem e cantassem aos sábados, domingos ou dias de festas. Já nas cidades, os batuques eram proibidos. Temia-se que os agrupamentos de escravos degenerassem em movimentos subversivos. As únicas festas autorizadas eram as de cunho cristão: a de Nossa Senhora do Rosário, padroeira dos pretos, as congadas e outras do mesmo gênero.

QUESTIONÁRIO:
1 — Por que os portugueses introduziram o trabalho escravo no Brasil?
2 — A África era um continente sem cultura? Analise e comente.
3 — Em termos políticos, como era a África?
4 — Por que, em geral, eram negros que capturavam outros negros?
5 — O tráfico de escravos era economicamente vantajoso? Comente.
6 — Comente a respeito do transporte e do comércio de escravos
7 — Comente a respeito das diversas finalidades da mão de obra escrava.
8 — Comente a respeito do texto de Casa Grande e Senzala (em itálico)
9 — Houve resistência por parte do negro contra a opressão escravista? Comente.
10 — Explique o surgimento das irmandades católicas negras
11 — Explique o que era o negro de ganho.
12 — Comente a respeito da influência da cultura negra
13 — Comente a respeito da influência da religiosidade negra
14 — Comente a respeito da importância do negro na formação da sociedade brasileira.


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