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2º e 3º ano do Ensino Médio (TARDE)
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TURMA:
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Data
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DISCIPLINA: FILOSOFIA
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PROF.: RODRIGO
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ASSUNTO: Genealogia dos
valores
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VALOR:
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NOTA:
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Genealogia dos valores Rodrigo dos Santos Manzano
Na ótica nietzschiana, a questão do valor apresenta duplo caráter: os valores supõem perspectivas que os engendram; estas, por sua vez, ao criá-los, supõem um valor que as norteia. É nisso que consiste o procedimento genealógico. A genealogia comporta assim dois movimentos inseparáveis: de um lado, relacionar os valores com perspectivas avaliadoras e, de outro, relacionar estas perspectivas avaliadoras com um valor.
É preciso, pois, encontrar um valor ou,
se se quiser, um critério de avaliação que não tenha sido criado, ele mesmo,
por uma perspectiva avaliadora. Em outras palavras: é preciso adotar um
critério de avaliação que não possa ser avaliado. E o único critério que se
impõe por si mesmo é a vida. “É preciso estender os dedos, completamente, nessa
direção e fazer o ensaio de captar essa assombrosa finesse – de
que o valor da vida não pode ser avaliado”, afirma Nietzsche. “Por um
vivente não, porque este é parte interessada, e até mesmo objeto de litígio, e
não juiz; por um morto não, por uma outra razão” (Crepúsculo dos Ídolos,
“O Problema de Sócrates”, parágrafo 2).
Moral, política, religião, ciência,
arte, filosofia, qualquer apreciação de qualquer ordem deve ser submetida ao
exame genealógico, deve passar pelo crivo da vida. Fazer qualquer apreciação
passar pelo crivo da vida equivale a perguntar se contribui para favorecê-la ou
obstruí-la; submeter ideias ou atitudes ao exame genealógico é o mesmo que
inquirir se são signos de plenitude de vida ou da sua degeneração; avaliar uma
avaliação, enfim, significa questionar se é sintoma de vida ascendente ou declinante.
“Viver”, define Nietzsche em Para
Além de Bem e Mal, “é essencialmente apropriação,
violação, dominação do que é estrangeiro e mais fraco, opressão, dureza,
imposição da própria forma, incorporação e pelo menos, no mais clemente dos
casos, exploração” (parágrafo 259). A partir daí, compreende-se que ele encare
a moral cristã como negação da vida. E, se tivesse sentido falar em bem e mal,
consideraria bom tudo o que contribui para a expansão e exuberância da vida e
mau tudo o que provém da fraqueza.
Transvaloração dos valores
Mas ao lado da vertente corrosiva de sua obra, Nietzsche apresenta-nos outra, construtiva. Entendendo que o filósofo deve ser o “médico da civilização”, a ele atribui a tarefa de “resolver o problema do valor”, “determinar a hierarquia dos valores”. A filosofia tem de mergulhar fundo na própria época para ultrapassá-la; ela deve visar o que está por vir, tendo em mira um objetivo preciso: a criação de valores.
Mas ao lado da vertente corrosiva de sua obra, Nietzsche apresenta-nos outra, construtiva. Entendendo que o filósofo deve ser o “médico da civilização”, a ele atribui a tarefa de “resolver o problema do valor”, “determinar a hierarquia dos valores”. A filosofia tem de mergulhar fundo na própria época para ultrapassá-la; ela deve visar o que está por vir, tendo em mira um objetivo preciso: a criação de valores.
É por isso que Nietzsche concebe sua
obra como a tentativa de retomar as rédeas do destino da humanidade. Sócrates
representou um marco na visão grega do mundo, substituindo o homem trágico pelo
teórico; e Cristo, um marco no pensamento ocidental, substituindo o pagão pelo
novo homem. Mas, com ele, a negação deste mundo em que vivemos aqui e agora “se
fez carne e gênio”. Inimigo implacável do cristianismo, Nietzsche nele
encontrará um adversário que julga à sua altura. Conta inverter o sentido que
ele procurou dar à existência humana; espera subvertê-lo. E, para inaugurar esta
nova era, tem de realizar a transvaloração de todos os valores.
Transvalorar é, antes de mais nada,
suprimir o solo a partir do qual os valores até então foram engendrados. Aqui,
Nietzsche espera realizar obra análoga à dos iconoclastas: derrubar ídolos, demolir
alicerces, dinamitar fundamentos. É deste ponto de vista que critica a
metafísica e a religião cristã.
Traço essencial de nossa cultura, o
dualismo de mundos foi invenção do pensar metafísico e fabulação do
cristianismo. Com Sócrates, teve início a ruptura da unidade entre homem e
mundo – e a filosofia converteu-se, antes de mais nada, em antropologia. Com o
judaísmo, houve o despovoamento de um mundo que estava cheio de deuses – e a
religião tornou-se, acima de tudo, um “monótono-teísmo”. Com o cristianismo,
propagou-se a mentira da vida depois da morte e do chamado reino de Deus.
Desvalorizando este mundo em nome de um outro, essencial, imutável e eterno, a
cultura socrático-judaico-cristã é niilista desde a base.
Transvalorar é, também, inverter os
valores. Aqui, Nietzsche conta realizar obra análoga à dos alquimistas:
transformar em ouro o que até então foi odiado, temido e desprezado pela
humanidade. É deste ângulo de visão que denuncia o idealismo e reivindica a
adesão a esta vida tal como a vivemos, a aceitação deste mundo tal como o
encontramos aqui e agora.
É chegada “a hora do grande desprezo”; é
chegado o momento de questionar tudo o que até então o ser humano venerou e,
pelo mesmo movimento, afirmar tudo o que até então ele negou. Só assim será
possível revelar o que por trás dos valores instituídos se esconde e trazer à
luz o que eles mesmos escondem. Se outrora o maior delito era o cometido contra
Deus, agora mais sacrílego ainda é delinquir contra a Terra. Se outrora se
prezava acima de tudo a vida depois da morte, agora é urgente entender que
eterna é esta vida. Se outrora a alma mostrava descaso pelo corpo, agora é
preciso que o corpo torne evidente o caráter fictício da alma.
Transvalorar é, ainda, criar novos
valores. Aqui, Nietzsche pretende realizar obra análoga à dos legisladores:
estabelecer novas tábuas de valores. É desta perspectiva que concebe a
filosofia.
Eliminando as esperanças ultraterrenas,
Zaratustra, “o sem-Deus”, conta reinscrever o ser humano na natureza.
Suprimindo o além, Nietzsche, “o anticristo”, quer estabelecer uma nova aliança
entre homem e mundo. Naturalizar os valores morais, é nisso que consiste seu
empreendimento filosófico.
É bem verdade que, em momento algum, o
autor de Assim Falava Zaratustra pregará um tipo de
comportamento determinado ou imporá um estilo de vida específico; ele jamais
pretenderá dizer o que se deve fazer. Sublinhando o caráter singular e
irrecuperável de cada ação, Nietzsche insistirá em fazer ver que nosso modo de
agir tem doravante de nortear-se por valores em consonância com a Terra, com a
vida, com o corpo.
E, para tanto, ele se empenhará tanto na
crítica corrosiva dos valores quanto na criação de novos valores. Genealogia e
transvaloração aparecem assim como as duas faces da mesma moeda. Afinal, “quem
quiser ser um criador no bem e no mal, esse tem de ser um aniquilador e
destruidor de valores”.
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